A jornada de Soraia: quando correr é mais do que chegar à meta

Começou de forma discreta, sem alardes nem grandes planos, apenas com um objectivo pessoal: perder peso e reencontrar-se com o seu corpo. Foi assim, sozinha, que a Soraia deu os primeiros passos na corrida, inspirada por aqueles que via a correr na rua e com a esperança, quase secreta, de um dia conseguir fazer o mesmo. O que talvez não soubesse na altura é que esses passos marcariam o início de uma mudança muito maior.

Hoje, a corrida representa mais do que um desporto. É um tempo só seu. Um momento de silêncio no meio do ruído diário, em que pode simplesmente existir — longe das responsabilidades, perto de si mesma. Enquanto a filha treina, ela corre. Prefere fazê-lo sozinha, não por falta de companhia, mas porque esse é o seu escape, o seu refúgio. Ainda assim, há momentos de partilha: como aquele em que o filho mais novo a acompanhou numa corrida no Dia da Mãe. São memórias que valem ouro — e que deixam marca, sobretudo neles, que crescem a ver o exemplo de esforço, superação e persistência.

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Os treinos acontecem quase sempre em contacto com a natureza. Seja à beira-mar, seja num trilho mais escondido, precisa de sentir o chão, o vento, o cheiro do verde. Desde Outubro de 2024 já participou em várias provas de 8 e 10 km, e até num trail de 12 km. Mas foi a primeira, no Jamor, que mais a marcou. Não só por ter sido a estreia, mas porque foi dura — fisicamente e emocionalmente. Ainda assim, não desistiu. Tinha uma amiga ao lado que a puxou ( Ana Lopes ), e isso fez toda a diferença.

As dores vieram depois, claro. Aquelas dores musculares traiçoeiras que nos fazem duvidar. Mas, com o tempo, aprendeu que o segredo está em não parar. O corpo adapta-se, aguenta mais do que pensamos. Nunca pensou em desistir, porque desde o início que se convenceu de que era capaz, independentemente das dificuldades. E essa crença transformou-se num estilo de vida.

Curiosamente, a alimentação mudou antes da corrida — por necessidade. Mas acabou por se tornar um pilar importante neste novo percurso. Não tem rituais antes das provas, nem manias ou superstições. Sai de casa apenas com um pensamento: dar mais de si do que no treino anterior. Leva sempre o telemóvel e os auscultadores — a música mexida dá-lhe a energia que precisa para seguir em frente.

A grande motivação é interna. É nela que encontra força, é nela que está o impulso para continuar. Ainda assim, há fontes de inspiração externas que a ajudaram a começar — como a página Aminhacorrida, que seguia mesmo antes de calçar as sapatilhas pela primeira vez. Hoje, poder dar esta entrevista é uma espécie de volta completa.

Faz parte dos Agualva Runners, um grupo onde se sente acolhida, mesmo que nem sempre consiga treinar com eles. É treino e é tribo, como ela diz. E foi nesse espírito de equipa que percebeu o quanto evoluiu. Voltou recentemente à mesma prova que a viu começar, e desta vez foi ela quem puxou por outra corredora. Percebeu ali o quanto tinha crescido — de quem precisou de apoio, passou a ser quem o oferece.

Partilha as suas conquistas nas redes sociais, na esperança de inspirar quem a segue. E já o fez: a filha, por exemplo, dizia que não conseguia acompanhá-la. Até que conseguiu correr 7 km sem parar. Um daqueles momentos que ficam para sempre gravados na memória.

Se pudesse correr ao lado de alguém, escolheria os filhos. Gostava que fizessem uma prova com ela, que sentissem o que é cortar uma meta depois de se dar tudo. E se pudesse falar com a Soraia de antes da corrida, diria apenas: “Não desistas, vais conseguir.”

O elogio mais marcante não veio com palavras, mas com olhares, com gestos. E com a certeza de que inspirou alguém a levantar-se do sofá e a dar o primeiro passo. Para os filhos, é uma mãe que se superou, que fez coisas que antes pareciam impossíveis — e que continua a correr porque isso a faz feliz.

A meta mais próxima é a meia maratona até ao final de 2025. Mas não vive obcecada com objectivos a longo prazo. Prefere ir vivendo, correndo um dia de cada vez, com os pés assentes na terra e o coração pronto a dar tudo.

No fim, resume tudo numa frase: correr, para ela, é sinal de saúde, superação, determinação, bem-estar… e, acima de tudo, um porto de descanso. Onde se reencontra. Onde se sente em casa. Onde é feliz.