Anna: A Corrida como Caminho para a Transformação e Felicidade

Comecei a correr há cerca de um ano, numa fase em que atravessava uma crise pessoal muito séria. Descobri que uma corrida leve de 40 minutos me ajudava a organizar os pensamentos, e apaixonei-me pela clareza e serenidade que a corrida me proporcionava.

Vindo da Rússia, a adaptação à corrida em Portugal foi um processo inspirador. Portugal tem uma enorme popularidade pela corrida, algo que seria difícil de imaginar no meu país natal.

A quantidade de provas e o nível de envolvimento aqui são impressionantes, o que torna os resultados no atletismo amador bastante elevados. A acessibilidade e o entusiasmo por esta modalidade tornam o ambiente muito acolhedor.

Sendo mãe de três filhos, encontrar tempo para correr é um desafio, mas acredito que o exemplo que damos aos nossos filhos é mais importante do que as palavras que lhes dizemos. Alguns dos meus filhos partilham a minha paixão, enquanto outros têm interesses diferentes. No entanto, acredito que mudar os nossos filhos começa por mudar a nós mesmos.

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O trail running tornou-se uma paixão importante na minha vida. Utilizo-o como preparação no período de base para provas de estrada, mas também pelo prazer único que proporciona. Os resultados no trail são difíceis de comparar, e isso tira um pouco da pressão, permitindo-me desfrutar da conexão com a natureza, o meu corpo e a comunidade acolhedora que o trail oferece. Os ultra trails, em particular, são experiências profundas, quase espirituais, que me permitem explorar novos limites físicos e mentais.

Treino seis vezes por semana, incluindo duas sessões intervaladas e uma corrida longa. Durante o período de base, faço corridas em jejum para treinar o metabolismo de gorduras. Sou vegetariana há 20 anos, e sinto que isso beneficia a minha performance. Além disso, complemento os treinos com Pilates e exercícios de core para fortalecer os músculos abdominais e garantir estabilidade, essencial para evitar lesões, sobretudo após ter sofrido uma grave fratura na coluna.

A minha corrida de sonho seria completar as 6 World Marathon Majors em menos de três horas, com um carinho especial pela Maratona de Nova Iorque. No trail running, o meu objetivo é qualificar-me para a final do UTMB Mont Blanc. A Maxi-Race Madeira foi, até hoje, a corrida mais marcante da minha vida. Enfrentar os 55 km com 3000 metros de desnível foi um desafio extraordinário que me levou a territórios físicos e mentais que nunca imaginei alcançar.

Gosto de correr sozinha para estar comigo mesma, mas quando os treinos ultrapassam os 70 km semanais, começo a sentir falta de conexão humana. Nessas alturas, as corridas em grupo tornam-se preciosas. Nos dias difíceis, o que me motiva a continuar é o hábito. Nunca questiono se devo correr ou não, tal como nunca me pergunto se devo lavar os dentes. Esse compromisso faz toda a diferença.

Para quem está a começar no trail running, o meu conselho é simples: seja consistente. Corra devagar, de forma que possa correr novamente no dia seguinte. No final de cada corrida, deve sentir-se capaz de começar tudo de novo. Portugal é um paraíso para corredores, com trilhos espetaculares em Sintra, Madeira, Açores e Algarve, cada um com a sua beleza única.

Para enfrentar subidas e descidas íngremes, treino tanto de dia como de noite, pois são desafios diferentes. Também faço exercícios em superfícies instáveis no ginásio para fortalecer os tornozelos e os gémeos. Preparar-me mentalmente para provas desafiantes envolve estar em paz comigo mesma e aceitar plenamente quem sou.

A minha família apoia-me, embora nem sempre gostem do tempo que dedico à corrida. No entanto, orgulham-se dos meus resultados, e o equilíbrio interior ajuda-me a manter as prioridades claras. A corrida mudou a minha vida, levando-me a fazer escolhas diferentes, a relacionar-me com pessoas mais positivas e a encontrar mais equilíbrio e alegria no dia a dia. Correr é, para mim, o caminho mais direto para a felicidade.

Já experimentei outras atividades, como patinagem no gelo e mergulho, mas no futuro gostava de dedicar mais tempo ao montanhismo e ao treino alpino. A comunidade de trail running é única, composta por pessoas descontraídas, alegres e reflexivas. Este desporto está em constante crescimento e acredito que, ao atrair mais pessoas, pode ajudar a combater crises pessoais e sociais, promovendo paz interior e uma maior conexão entre nós e o mundo ao nosso redor.

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