Os corredores que se preparam com afinco para as disputas competitivas devem considerar que a última etapa do treino é destinada aos processos regenerativos do organismo.
A recuperação total (tanto da mente como dos músculos) antes das competições principais é fundamental para o ótimo desempenho atlético e o alcance dos recordes pessoais. Os corredores alinhados na largada, sem os indesejáveis vestígios da fadiga física e mental que se acumulam ao longo do treino, estão aptos para os grandes resultados.
Esse período de recuperação que antecede as principais competições é denominado no meio desportivo como recuperação ou semana(s) regenerativa (s), sendo a sua característica a redução da carga de treino e a consequente recuperação física e mental do corredor.
Sabemos que na preparação para as competições a carga de treino cresce conforme o avançar das semanas. Essa elevação da quilometragem percorrida e o aumento gradual da intensidade do esforço promovem os ajustes 26 fisiológicos necessários à melhoria do condicionamento atlético e prepara o corredor para as exigências da distância competitiva.
Assim, se o desempenho desportivo máximo exige uma alta tolerância física e mental ao stresse provocado pelo treino, esse mesmo treino (que melhora a capacidade orgânica), se mantido de modo intenso e por longo tempo, também é capaz de reduzir a força e a resistência muscular do corredor, interferindo negativamente no seu desempenho competitivo.
O período de recuperação, portanto, auxilia o corredor de modo a afastá-lo dos rigores do treino intensivo, permitindo que seu corpo e mente se recomponham para as disputas mais importantes da temporada.
A redução gradual do volume e intensidade do treino promove uma adequada regeneração muscular e restauração completa das reservas energéticas (existência de carboidratos nos músculos). O corredor, ao fazer a recuperação, portanto, torna-se forte e disposto para o grande dia.
Mas, quanto tempo deve durar o período de recuperação? E quanto deve ser a redução da carga de treino?
DURAÇÃO DA RECUPERAÇÃO E EDIÇÃO DA CARGA
As pesquisas científicas e também o saber pírico mostram-nos que, dependendo da distância competitiva, a recuperação apresenta-ma duração variável (ver tabela abaixo).
DURAÇÃO DO PERÍODO DE RECUPERAÇÃO
| DURAÇÃO DO PERÍODO | |
| DE RECUPERAÇÃO CONFORME | |
| DISTANCIA COMPETITIVA | |
| MARATONA | 19 a 22 dias |
| 15 a 21 Km | 11 a 14 dias |
| 5 a 10 Km | 7 a 10 dias |
De um modo geral, podemos considerar-mo duas semanas o período necessário para a renegação orgânica para as disputas em distâncias acima de 42 km; e uma semana para distâncias até e inclusive 10 km.
A redução da carga de treino fica em torno 60% da quilometragem percorrida durante o período de preparação. No entanto, o percentual = redução da quilometragem, durante a recuperação, pode alcançar valores de até 85% m qualquer prejuízo relativamente à condição atlética.
Esse percentual de redução é distribuído longo das semanas destinadas à recuperação, ndo esse o factor que promove a recuperação gânica e deixa o corredor pronto para a sputa (ver tabela).
| QUILOMETRAGEM A SER REDUZIDA | ||||
| NA RECUPERAÇÃO | ||||
| EM % DA CARGA DE TREINO NA PREPARAÇÃO | ||||
| DISTANCIA | 3 SEMANA | 2 SEMANA | SEMANA DA PROVA | |
| MARATONA | 20% | 40% | 60% | |
| 15 a 21 KM | 0% | 30% | 50% | |
| 5 a 10 Km | 0% | 20% | 50% | |
No caso da maratona, a competição irá correr no final da terceira semana, sendo que o percentual de redução está relacionado com a rga de treino durante o período de preparação quilometragem percorrida nesse período).
PERDA DE CONDIÇÃO FÍSICA?.
Alguns treinadores e corredores acreditam, sem qualquer fundamento, que essa redução pode provocar uma perda da condição atlética adquirida ao longo da preparação, ocasionando a piora do desempenho na competição.
Entretanto, sabemos que, mesmo quando a quilometragem é reduzida, o consumo máximo de oxigénio (VO2max), um dos factores da melhora da condição atlética, pode ser mantido com uma frequência de treino de apenas 2/3 do total, ou seja, para quem treina 6 vezes por semana, uma redução para 4 dias já seria suficiente para a manutenção do VO2max.
Também ocorre uma ligeira ampliação no limiar anaeróbio do corredor, constatado na menor concentração do lactato no sangue após o esforço para uma mesma carga de treino, comparando-se antes e depois da recuperação. Com isso, o corredor apresenta uma maior capacidade de resistência, tolerando uma maior intensidade do exercício durante um tempo mais prolongado. A fadiga chegará mais tarde!
Importante destacar que, durante a recuperação, a quilometragem é reduzida, mas a intensidade pode ser mantida. Desta forma, o corredor pode optar por realizar uma ou duas sessões em ritmo competitivo. Um exemplo é a aplicação do método fartlek, onde a alternância da intensidade do esforço (forte e fraco) é muito útil a esse propósito (veja os exemplos de planos de treino).
| EXEMPLO DE PLANO DE TREINO PARA 10 KM ( RECUPERAÇÃO 7 DIAS) | |||||||
| SEG | TER | QUAR | Quin | Sex | Sab | Dom | |
| Trote 40 | fartlek | Ritmo | Descanso | Trote 30 | Trote 20 | Competição | |
| na relva | 10*400m | 2*3.000m | na relva | na relva | |||
| Alongamentos | acelerado *200 m ( trote) | Alongamentos | Alongamentos | ||||
MELHORIA NO DESEMPENHO APÓS A RECUPERAÇÃO
Embora necessite de pesquisas mais conclusivas a respeito desse tema, alguns dados científicos e a observação do quotidiano indicam uma média no nível de melhoria no desempenho (nos atletas que fazem a recuperação), por volta de 3%.
Isto significa que na maratona o tempo final pode ser reduzido em mais de 5 minutos (para desempenho de até 3 horas), e numa prova de 10 km, o corredor pode melhorar o seu tempo em mais de 1 minuto (para desempenhos até 40 minutos).
Isso mostra a vantagem de se programar o período de recuperação para as disputas principais da temporada, pois a possibilidade de ganhos extras no desempenho é real e vale a pena esse “esforço”!
Apesar das evidências, a recuperação deve ser realizado sempre em todas as provas?
QUANDO FAZER A RECUPERAÇÃO
A recuperação, apesar de comprovada eficácia, não necessita ser realizado em todas as provas, porém, apenas para aquelas que o corredor julgar as mais importantes da temporada. Nas demais competições, o corredor seguirá a sua programação normal de treino, obedecendo apenas à questão da semana regenerativa, ou seja, treinar intensivamente durante três semanas e descansar na quarta (a competição deve ser inserida no final da quarta semana).
Assim, conforme os princípios da biologia do desporto, o aumento da carga de treino cresce durante as três primeiras semanas do ciclo de treino e, na quarta semana, decresce para mais de 50%, deixando o organismo livre do stresse e permitindo uma adequada recuperação.
| SEM 1 | SEM 2 | SEM 3 | SEM 4 |
| 60% | 80% | 100% | 40% |
Uma outra opção, para os corredores experientes e com pouco tempo para treinar para uma competição, é a aplicação de um ciclo de preparação onde as cargas crescem e atingem o seu ponto máximo na própria competição.
A esse modo de aplicação da carga de treino denominamos de ciclo crescente imediato para a competição. Com esse ciclo, a etapa de recuperação não é realizada, sendo que o corredor irá ser beneficiado pelo estímulo imediato das cargas, que crescem durante um breve período. Esse ciclo pode ser utilizado pelos corredores experientes durante a preparação para a maratona, onde o último será realizado na própria competição.
| SEM 1 | SEM 2 | SEM 3 | SEM 4 |
| 25 KM | 30 KM | 35 KM | 42 KM |
Muita atenção deve ser dada a esse ciclo de treino, devido à sequência de treinos longos. A recuperação deverá ser programada para durante a semana, sendo que esse ciclo não deve ser realizado com frequência, mas apenas em ocasiões extremas e muito específicas e por corredores que apresentam alta quilometragem percorrida ao longo dos anos.
EXEMPLO DE PLANO DE TREINO PARA MARATONA (RECUPERAÇÃO 14 DIAS)
| EXEMPLO DE PLANO DE TREINO PARA MEIA MARATONA (RECUPERAÇÃO 14 DIAS) | |||||||
| SEG | TER | QUAR | Quin | Sex | Sab | Dom | |
| Trote 40 | Rodagem | Fartlek | Descanso | Trote 40 | Rodagem progressiva | Competição | |
| na relva | 60´ | 10*800 * 400 m trote | na relva | 40 confortável | |||
| Alongamentos | confortável | Alongamentos | 40 ritmo | ||||
| Trote 40 | Rodagem | Descanso | Trote 40 na relva | Trote 30 | Descanso | Competição | |
| na relva | 60 | na relva | |||||
| Alongamentos | confortável | Alongamentos | |||||
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na nossa experiência com o treino da corrida de fundo, onde nos deparamos com corredores dos mais variados níveis de condição física, desde o alto rendimento ao participativo, sempre defendemos a etapa regenerativa antes das competições mais importantes para o corredor.
O período de recuperação ou a semana regenerativa é o momento para o corredor “recarregar a bateria”, e deixar tudo em ordem para a grande disputa. O corredor tem a opção de reduzir a quilometragem treinando em menos dias durante a semana ou percorrendo menos quilómetros diariamente.
Não podemos esquecer que a exigência do treino para a competição expõe o organismo ao stresse do exercício físico, lesando o corpo. A fadiga física e mental gerada pelo treino intensivo e que se acumula ao longo das semanas é factor de risco de inúmeras lesões e do afastamento do corredor dos treinos e competições.
Assim, é fundamental para um desempenho competitivo de qualidade, a redução programada da carga de treino, o repouso, o lazer e a boa alimentação. O corpo, que não é uma máquina, precisa do necessário descanso para restaurar as energias e estar em perfeito estado de prontidão para os êxitos desportivos.


